Vivíamos no interior do interior e era ótimo.

Não se falava em periferia naquela época.

Um bambuzal sombreava a estrada de cascalho.

Vacas pastavam tranquilas depois da ordenha.

Eu seguia rumo às chácaras para ganhar a vida.

Enxada nas costas e mil histórias na cabeça.

Já sonhava com poesia naquele tempo distante.

Magrinha e muito delicada você subia a serra.

Ia para o colégio e eu te encontrava. Sorria.

Um “oi” e “boa aula” era nossa comunicação.

Eu seguia meu caminho e te levava na cabeça.

À noite, no curso técnico, eu fugia da realidade.

Mergulhava em pensamentos e te revia feliz.

Aquele sorriso matinal me enchia de alegria.

Altas horas, voltava para casa e perdia o sono.

Ansiava pela manhã e por aquela magia de “oi”.

E tudo florescia em mim, quando você passava.

Enxada nas costas, chegava ao pé do eito.

Trabalhava sem sentir cansaço e tudo era leve.

Sem perceber, as coisas se transformaram.

Meu corpo deu um salto, mas meu espírito, não.

Corri o mundo, vi realidades, inventei histórias.

Senti dores, medos e o amargo da derrota.

Em apuros, invocava teu sorriso e aquele “oi”.

E tudo urgiu, se modificou e eu envelheci.

Mudei de cidade, mas nunca deixei a poesia.

Dia destes, caminhando, vi um bambuzal.

Parei. O vento soprou. Juro que ouvi teu “oi”.

Jossan Karsten

Imagem: Pixabay

6 ago 2020, às 12h41. Atualizado em: 2 set 2020 às 11h01.
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