por TOMMO

A história da faxineira muda que se apaixona por um monstro aquático do conto de fadas moderno A Forma da Água, do diretor Guillermo del Toro, era o ganhador ideal do Oscar de melhor filme. É visualmente deslumbrante, tem atuações excelentes e uma importante mensagem sobre o “outro” na sociedade ocidental.

O filme é feito para a premiação, deixando pra trás histórias como a de uma mulher que luta por justiça para sua filha assassinada (Três Anúncios para Um Crime), dois dramas britânicos passados na 2ª Guerra Mundial (O Destino de Uma Nação e Dunkirk) e de um delicado romance gay adolescente (Me Chame Pelo Seu Nome), que também foram indicadas ao prêmio.

Mas e os longas sobre os distúrbios raciais de 1967 nos Estados Unidos (Detroit em Rebelião) ou sobre a história de um grupo de mulheres que se sentem atraídas por um capitão ferido da Guerra Civil Americana (O Estranho que Nós Amamos) ou mesmo de uma princesa amazona que deixa a segurança de sua ilha natal para salvar o mundo (Mulher Maravilha)?

Mulher Maravilha foi o 10º filme de maior bilheteria em 2017. Assim como outras produções de super-herói e aventura de grande orçamento, caso de Star Wars: O Último JediA Bela e a Fera e Jumanji, o longa não conseguiu emplacar nas categorias de atuação, direção ou roteiro no Oscar.

O filme de guerra Dunkirk, de Christopher Nolan, que ficou entre as 20 maiores bilheterias de 2017, foi o único desse gênero a receber indicações. O último longa puramente de ação-aventura a triunfar em alguma das principais categorias da mais importante premiação cinematográfica do mundo foi a aclamada trilogia de Batman, dirigida por Nolan, que conseguiu uma indicação póstuma de ator-coadjuvante a Heath Ledger em 2009 (que acabou ganhando).

Indicações ao Oscar de filmes de fantasia e ficção científica são igualmente raras, com exceção de Star Wars em 1977, e de O Senhor dos Anéis: O Retorno do Rei em 2004, que concorreu em 11 categorias, sendo 8 delas técnicas.

“O que esses prêmios significam?”, questiona Andy Serkis, ator britânico que participou da trilogia de Senhor dos Anéis e, mais recentemente, Pantera Negra.

“Eles são prêmios de prestígio para produções sérias. Mas blockbusters têm performances que precisam de muitas habilidades. Você tem que ser um atleta, um comediante, ter controle técnico e dar vida a um personagem do mundo da fantasia. Não é sentar na mesa da cozinha e lamentar sobre a vida”, diz.

“Recentemente, os filmes que fiz, Planeta dos Macacos: A Guerra e Star Wars: O Último Jedi, são todos sociologicamente relevantes, falam sobre a condição humana, sobre mitos dos dias atuais.”

Talvez uma resposta seja que estúdios como a Marvel simplesmente não precisam cogitar fazer uma campanha por um Oscar para aumentar seu apelo.

“Prêmios são apenas a cobertura do bolo. A gente assa o bolo”, diz a produtora-executiva de Pantera Negra, Victoria Alonso.

E, apesar de ser um marco no que diz respeito à diversidade no elenco, nem os atores nem o diretor de Pantera Negra, Ryan Coogler, devem alimentar esperanças de que algo mude em 2019, diz Kaleem Aftab, crítico de cinema do jornal britânico The Independent e um dos curadores do festival The East End.

“O Oscar dá uma impulsionada nos filmes, mas longas como Pantera Negra não precisam disso”, diz.

Déficit de diversidade

Comédias também são raras entre os indicados a melhor filme, apesar de Annie Hall, de Woody Allen, ter faturado o prêmio em 1977.

Três Anúncios para Um Crime certamente tem seus momentos de humor negro – e muito se discutiu se estes seriam de bom gosto, apesar de Sam Rockwell ter ganhado o Oscar de melhor ator coadjuvante por seu papel como um policial racista.

Filmes de terror, com exceção de O Exorcista (1974) também aparecem raramente na lista de concorrentes. Mas, neste ano, uma comédia de terror, Corra!, recebeu quatro indicações, e seu diretor, Jordan Peele, ganhou na categoria de melhor roteiro original. O crítico Kaleem Aftab acredita que a demanda por diversidade na indústria aumentou as chances de Corra!.

“Recentemente, o Oscar se tornou mais consciente do déficit de diversidade que existe e tem tentado lidar com isso. Corra! é um filme incomum, já que lembra em vários aspectos ‘Adivinha Quem Vem para o Jantar?’ (1967), que também concorreu a melhor filme”, diz ele.

“Então, enquanto é muito inusitado que uma comédia de terror seja indicada ao Oscar, o argumento é menos válido quando se trata de filmes que abordam a questão racial e que conseguem um peso maior do que têm. O Oscar também adora histórias de sucesso, e é discutível que Corra! tenha sido o filme mais bem-sucedido do ano – se o critério for o faturamento de bilheteria em relação ao orçamento.”

O inusitado Oscar de melhor filme para Moonlight em 2017, com sua temática sobre raça e sexualidade, pode ter aberto o caminho para indicações neste ano de longas como Mudbound – Lágrimas Sobre o Mississippi e Me Chame Pelo Seu Nome.

Mas a conexão com o público também é vital, segundo Tim e Trevor White, produtores-executivos de The Post – A Guerra Secreta, de Steven Spielberg, indicado a melhor filme neste ano.

“O movimento #Metoo apareceu na época do lançamento de The Post, e nossa história é sobre uma mulher tentando encontrar sua voz”, diz Tim White, sobre o papel de Meryl Streep como a inexperiente editora-executiva do The Washington Post durante o governo Nixon.

“Não quero dizer que temos sorte em ter o Trump [como presidente], mas o filme mostra o que estava acontecendo no jornalismo e no mundo naquela época”, diz Trevor.

“Não posso jurar que teríamos Spielberg, Meryl Streep e Tom Hanks em The Post sem o Trump ter sido eleito”, acrescenta o produtor.

Sem apelo com o espectador

A falta de conexão com o espectador é a razão pela qual Melissa Silverstein, criadora do site Women and Hollywood (Mulheres e Hollywood, em inglês), acha que Detroit em Rebelião, da ganhadora do Oscar Kathryn Bigelow, foi ignorado na premiação deste ano.

Bigelow também foi criticada pela maneira como ela explorou os distúrbios raciais de Detroit em 1967 – e o filme não foi bem de bilheteria. Outro filme muito celebrado, de Sofia Coppola, O Estranho Que Nós Amamos, que rendeu a ela o prêmio de direção em Cannes, foi alvo de polêmica pelo fato de não haver um personagem negro, como existe na história original.

Um ano antes, O Nascimento de Uma Nação, de Nate Parker, foi comprado por um estúdio e tido como a grande esperança de diversidade no Oscar até que veio à tona que o diretor tinha sido absolvido de uma acusação de estupro em 1999 e que a mulher que o acusava cometera suicídio em 2012.

Esse processo afetou a bilheteria do filme e acabou com a esperança de prêmios.

E o ganhador do Oscar de melhor ator em 2017, Casey Affleck (Manchester à Beira Mar), poderia levar a estatueta neste ano após ser acusado de ter cometido assédio sexual em 2010?

“Polêmicas matam filmes, especialmente quando são produções não conectadas com o espírito do nosso tempo”, diz o crítico Kaleem Aftab.

“Por essas razões, Casey Affleck poderia não levar o Oscar neste ano. E não haveria chance para O Nascimento de Uma Nação e Detroit [concorrerem] porque foram fracassos de bilheteria. Isso liquidou esses filmes tanto quanto as polêmicas. Ultimamente, [o Oscar] é mais sobre a performance de um filme, basta olhar como Três Anúncios para Um Crime conseguiu levar dois troféus”.

No fim das contas, recursos financeiros podem continuar sendo uma parte essencial para o sucesso de uma campanha ao Oscar. Isso e a disposição para sorrir, de acordo com a britânica Charlotte Rampling, indicada em 2016 como melhor atriz pelo filme independente 45 Anos. “Não fizemos nada enquanto filme para ganhar uma indicação ao Oscar, apenas aconteceu”, diz ela.

“Mas, depois disso, você precisa de dinheiro. Os grandes exibidores estavam fazendo lobby como loucos e as outras atrizes também. Você tem que trabalhar imensamente por isso e participar de um monte de eventos. Eu não faria isso. Sempre digo: o que tiver de ser, será. E assim foi.”

11 mar 2018, às 19h24.

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